“Todas as imagens irão desaparecer”, começa assim Annie Ernaux no seu livro “Os Anos”. E a partir daí desliza uma cascata de imagens, num registo fragmentário, por meio da relação entre fotografias, canções, filmes, objectos, eventos.
“(…) ela só olhará para si própria para aí reencontrar o mundo, a memória e o imaginário das ideias, das crenças e da sensibilidade, as transformações das pessoas e do que ela viu e conheceu (…).”
O mundo é posto em palavras, e a memória é construída.
“Tudo se apagará num segundo. O dicionário acumulado desde o berço até ao leito da morte irá desaparecer. Depois, o silêncio e nenhuma palavra para o dizer. Da boca aberta nada sairá. Nem eu nem mim. A língua continuará a pôr o mundo em palavras. Nas conversas à volta de uma mesa em dia de festa seremos apenas um nome, cada vez mais sem rosto, até desaparecermos na multidão anónima de uma geração distante.”
Annie Ernaux é tida com uma das responsáveis por uma vertente de autoficção. A escritora recusa este termo.
Em Portugal, além do livro “Os Anos”, temos a edição recente de “O Acontecimento“ (ainda não li, mas tenho muita curiosidade em lê-lo. É sobre um tema actual, o aborto.), “Uma paixão Simples”, sobre o desejo e que foi adaptado ao cinema, e por fim “Um lugar ao Sol” e “Uma mulher”, compilados no mesmo volume.
Para quem gosta de ler em inglês, apesar da autora ser francesa, aconselho vivamente as fabulosas edições de Fitzcarraldo (que tem 8 títulos da Annie Ernaux no seu catálogo e dois que serão publicados no próximo ano, como o seu último romance “Le jeune homme”).
Fico muito contente por ver a escritora Annie Ernaux a ser laureada pelo prémio Nobel, porque a sua voz será mais ouvida.
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